Não é regra, mas quase sempre, após o sim para Deus, Ele nos conduz ao deserto.
Em toda a nossa existência, torna-se uma prática atravessar desertos. Que ninguém se engane com promessas de um mar de rosas e um mundo perfeito. Não nesta vida! Com certeza, e aguardada com dores de parto, somente no novo céu e nova terra, após a tão aguardada restauração da criação. Pois o Deus que tudo criou tem poder para recriar.
Mas veja, é no deserto que somos sacudidos e obrigados a refletir sobre as nossas ilusões, expectativas que nos alienam, nos afastam, inclusive, de quem amamos; também enxergamos os medos que mascaramos e dissolvemos em nossa busca frenética por realização e diversão.
No deserto o caminho não é claro, nem seguro, sol escaldante durante o dia e frio imenso à noite. Nenhuma distração, nada que seja atraente. Nele, o futuro é incerto, nos descobrimos vulneráveis, fragilizados e expostos aos nossos temores mais vis.
Mas deserto é lugar de encontro com Deus, de rendição do orgulho e da ilusão de sermos senhores do nosso destino. É o lugar da companhia divina, do silêncio que fala e onde o aquietar-se permite perceber a presença dEle.
O silêncio, nos torna mais sensíveis e atenciosos à voz de Deus.
É assim para todo o que quer andar com Ele. Para sermos livres precisamos nos afastar do mundo dos homens para entrarmos, a sós, no mundo de Deus. Um tempo no qual paixões, pressa, tensões, incertezas, vão, lentamente, cedendo espaço para percebermos o valor das coisas.
No deserto reduzimos nossas necessidades àquilo que é essencial. Afinal, muitas coisas não servirão para exatamente nada no deserto. O deserto traz uma outra dimensão das nossas reais necessidades.
Na solidão do deserto, descobrimos a suficiência da graça de Deus.
Aliás, Deus é a nossa necessidade primeira. De tudo que aprendemos no deserto, o mais importante é que, aquilo que mais necessitamos encontramos na comunhão com Deus. Ele, na verdade, será nossa única companhia durante a travessia.
A experiência deste atravessar conduz ao esvaziamento de nós mesmos, ao desapego dos ídolos que oferecem falsa segurança e à completa submissão à Deus e à sua vontade. Chega-se, durante os delírios ou nas tempestades de areia, a prometer, comprometer-se, arrepender-se.
É no deserto que aprendemos, ou reaprendemos, a ver a vida com a perspectiva da eternidade, ajudando-nos a colocar em ordem nossa lista de valores.
A verdadeira liberdade nasce no deserto. Foi no deserto que Jesus reafirmou sua identidade em obediência ao Pai. Não precisou de nenhum artifício para promover-se, nem utilizou-se de atalhos.
É aqui que nos libertamos dos falsos deuses, das mentiras e ilusões que nos fazem pessoas controladoras e manipuladoras.
O deserto rompe com a falsa sensação de que controlamos nosso destino e mostra-nos o quanto somos dependentes.
Finalmente, o deserto nos torna mais verdadeiros, amáveis, pacientes, livres e conscientes de nossa total dependência de Deus.
A Deus toda a glória!
Carlos R. Silva
outono 2014
Referências:
• Compilação do artigo:
Ricardo B. Souza, O deserto e a liberdade. A Espiritualidade, o Evangelho e a Igreja
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